15 fevereiro 2014

Que saudade do meu sertão



Ô moço, não perde essa menina não. Vê se olha pra ela e presta atenção nas coisas que ela não diz, ela tem um jeito só dela e de mais ninguém de falar com o silêncio. Ouça bem quando ela se calar.
Dia desses ela veio comigo prosear, com aqueles oios da cor do Velho Chico, tão marejados que dava inté pra navegar. Navegar na alma dela, moço. Ela tentou disfarçar, prender o choro e forçar um sorriso meio torto, oia só, deu dó. Um nó na garganta que fazia qualquer palavra virar pó. Ela não merece isso não, moço.
Ela  fala de você com uma doçura, com um amor nas palavras, fala dos seus feitos, do seu jeito, do seu sorriso, de como ocê canta pra ela na rede e de uma vez que ocês foram juntos cavalgar.  Mas ela fala com uma tristeza sabe, é que uma vez ela me disse que não te chama mais de amor, te chama de metade da alma. E quando nossa metade tá assim, distante, tudo deve parecer corte mal feito. Antes fosse por distâncias, por lonjuras, mas é por ausência. Ocê tá aqui e num tá. Faz tudo e a deixa de reserva, e ela tá sempre lá esperando, te esperando.
Veja só, eu disse pra ela falar, eu disse pra contar pro sinhô tudo que tá no coração dela. Porque doença no coração, faz adoecer todo o resto. Mas a mocinha é tinhosa, sô. Teimosa que só, disse que não conta porque no fundo cê há de saber.
Oia moço, eu não sei quanto tempo ela vai aguentar, mas uma vez passeando pela capital, paramos na estátua de Iracema e ela descambou a me contar a história, história bonita seu moço. Mas ela diz que não quer ter esse final não, disse que não quer largar tudo por amor. Disse coisas da cidade grande, de mudar de estado pra cursar uma tal de agrimensura, voltar e ajudar o pai na fazenda.
Vê se aceita um conselho desse velho que muita já viu dessa vida, o coração dela tá ficando apertado. Ela tá se acostumando a ficar sem você, ela tá deixando o sertão, moço, e tá te deixando junto.
Ela não quer isso, no fundo, eu sei que não quer. Ela tem sonhos, ela tem muitos sonhos, mas queria que ocê sonhasse junto dela. Porque eu bem sei, que por mais que Iracema não a encha os olhos, se ocê der a mão, ela vai. Então não deixa a moça fugir assim, ela te ama homi, desses amor raro de encontrar. Vai atrás dela, faz ela entender que ocê divide o peso do mundo com ela se assim tiver que ser. Porque o que não vale, moço, é ver o amor passar e depois lamentar a saudade do seu sertão.

2 comentários:

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...